Língua dinâmica

Não, não estou falando de coisas que você pode fazer com a sua língua! Estou falando da Língua Portuguesa! Esclarecido o título desse texto, agora vamos dividir o tema em Língua Portuguesa portuguesa e Língua Portuguesa brasileira. Isso porque quero contar-lhes sobre o interessante encontro entre brasileiros e portugueses durante os seis dias que passei na Irlanda com uma excursão.
Eu já estava com essa excursão há treze dias viajando pela Inglaterra e pela Escócia. Após esse período, dos quarenta brasileiros, sobraram dezessete seguindo para a Irlanda. O grupo era bacana e ficou bastante unido durante esse tempo. Eu viajava sozinha, o grupo me adotou e a amizade foi quase instantânea!

Em um desses dias, vi alguns dos amigos de Minas Gerais conversando e perguntei: “Qual é o babado?”. Eles não entenderam a pergunta, pois “babado” para eles tinha a ver com os possíveis significados literais da palavra (tecido franzido que enfeita uma roupa ou molhar-se com baba, saliva). Expliquei-lhes, no Rio de Janeiro, especialmente entre meus amigos gays, é comum essa expressão, que significa: “Qual é a novidade?”. Eles riram muito da expressão, ao que acrescentei que também poderíamos usar: “Babadinho, para uma novidade simples, pequena; babadão para os grandes babados e babadex, para babados extra interessantes”. Adoraram e adotaram a expressão e suas variações rapidamente. Não só eles como o grupo todo, incluindo a simpática guia portuguesa Lurdes.

Enfim, ao longo de treze dias para todo lado ouvia-se: “Geeeente, qual o babado?”, ou “Nossa, que babadão!”, ou “Ah, é só um babadinho!”, ou “Ai, gente, isso é babadex!”.  E assim chegamos ao ponto em que encontramos o grupo de portugueses na Irlanda e viramos minoria.
Como nossa guia era muito simpática e agregadora, tratou logo de informar ao grupo de portugueses que a viagem seria muito interessante devido a essa mistura da Língua Portuguesa com a Língua "Brasileira". Bom, e como repetíamos a todo momento as expressões acima, ela teve que lhes dizer que ouviriam a todo momento a expressão: “Qual é o babado?”.
Nossa interação não foi imediata, afinal, os brasileiros já estavam juntos há algum tempo e era cômodo que quiséssemos permanecer assim. Mas, dada a circunstância de andarmos horas a fio dentro de um ônibus, a interação veio naturalmente.

Em uma das paradas hidráulicas (pipi stop) do ônibus, o grupo estava concentrado na porta esperando para entrar e continuar viagem e, como sempre fazia, perguntei aos mais chegados:
- Qual o babado?
Porém, dessa vez havia uma portuguesa também, a qual me perguntou:
- Babado? Que negócio é esse de babado? Não estou a babar!
Confesso que não sabia o que responder. Na falta de uma explicação plausível, pois o sentido era figurativo demais, preferi filosofar sobre o idioma.
- Nós os brasileiros transformamos a Língua o tempo todo, tornando-a dinâmica, sempre em mutação, ao passo que os portugueses preservam-na praticamente intacta, original. Mantêm o sentido literal das palavras. Não fazem essa bagunça que fazemos com o sentido das palavras!

Sem ter a intenção, criei uma polêmica enorme! Ao final, havia portugueses apoiando o dinamismo da Língua e outros defendo sua manutenção. Entre os brasileiros, foi praticamente unânime a defesa da nossa Língua Portuguesa brasileira, cheia de palavras e sentidos novos, mutante, dinâmica. De minha parte, acho bonita a preservação do idioma e a forma correta como os portugueses falam, como usam os pronomes – mesmo que não os compreenda quando falam muito rápido. Mas o que sempre me chama a atenção é o fato de não usarem o gerúndio! Perceberam que a companheira de viagem portuguesa usou “não estou a babar” e não “babando”?

Quero ler mais os autores portugueses para ter contato com a “pureza” da Língua e estão na fila os livros de Saramago e Mia Couto (que é moçambicano). Por enquanto só li Miguel de Sousa Tavares e seu bom livro Equador. Recomendo e aceito dicas! Ah, e também aceito livros emprestados!

Ainda sobre Língua Portuguesa falada aqui e lá, há uma pesquisa interessante da FAPESP sobre o tema intitulada "As marcas do Português brasileiro".

PS: atualizei a crônica em jan/23 com essa charge porque "contar um babado" é o mesmo que "contar uma fofoca".





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