Eufrásia na cozinha

             Eufrásia, a gorda que me habita*, andava culpada por me obrigar a fazer dieta e a suar na esteira, pois, afinal, tenho as taxas altas por causa dela. Por isso, me convenceu a aprender a cozinhar para economizarmos e comermos o mais saudável possível. Topei. Receitas light na mão, muita disposição e tempo livre durante os jogos da Copa do ano passado, comecei a saga.
“Ué, na Copa? Você não gosta de futebol?”. Antecipo os comentários e informo que, depois que cochilei num jogo do Brasil e levei uma bronca, desisti de assistir qualquer jogo. Mas isso é assunto para outra crônica.
Comecei, muito chique que sou, com salmão. Nenhuma receita específica porque todo mundo dizia que era super mega fácil, que era só colocar azeite e uns temperinhos e assar no forno.
No entanto, ninguém me contou o que era temperar um salmão. Contaram-me como era: lava, coloca limão e sal. Mas o que é aquilo molenga e fedorento, gente? Demorei um tempo para agir reclamando e balançando o peixe na mão, chocada com o cheiro. Passado o trauma, lavei-o e espalhei o limão e o sal.
O problema do iniciante é ser abusado (meu caso) e, além do salmão e dos temperos, cortei batatas e coloquei-as para assar junto. Culpa da Eufrásia, que adora carboidratos!
O almoço saiu às quatro da tarde com o salmão desmanchando de tão assado e com algumas batatas assadas. Não contei, mas acho que 80% estavam cruas. Por fim,  estava ótimo, o tempero deu certo, ficou bom sim.
Vencida pelo salmão, parti para a próxima saga: receita com frango. Cozido, desfiado e pronto. Já viram? Espetáculo! Fui a três mercados e nada de achar a caixinha mágica. Desespero tomando conta porque eu já tinha comprado tudo para o risoto de quinua, alho poró e frango desfiado. Um luxo de almoço para receber uma amiga.
No terceiro mercado, perguntei ao moço de uniforme da loja:
A caixinha mágica
- Moço, não tem aquele frango desfiado? É da marca Vapza. Vem numa caixinha – perguntei desesperada.
- Olha, moça, se tiver fica ali – e apontou a prateleira.
            - Tem não moço, já vi. Não estaria em outro lugar?
            - Não. Se não estiver ali, não tem mesmo
- Caramba, e agora? Minha receita babou.
Vendo minha cara de pânico, ele deu a solução.
 – Compra o peito e faz na panela de pressão. É fácil! (lá vem o tal do ‘é fácil’ de novo! Afe...)
            - Moço, eu não tenho panela de pressão não. Uma amiga me proibiu de ter uma porque sou muito distraída.
            Nesse ponto do diálogo ele teve certeza que eu era uma maluca, porém, como sou simpática e ele muito prestativo, resolveu me ajudar.
            - Bom, então você compra o peito de frango e corta o nesse sentido (mostrou-me o dorso da mão como se fosse o peito de frango e a direção transversal do corte), cozinha, depois desfia.
Entretanto, ao ver minha cara de surpresa (ou de pateta?) com a explicação, resolveu me levar até o balcão das carnes. Isso foi fofo porque ele quase pegou na minha mão para me levar ao lugar certo. Não pegou, mas me conduziu como conduz uma criança a quem quer fazer parar de chorar prometendo um doce. Chegando ao balcão, pegou uma bandeja de peito de frango e mostrou de novo, pacientemente, como seria o corte.
- Nesse sentido, ó. – e foi repetindo o gesto até eu sorrir (ou até eu entender e parar de choramingar).
Voltei para casa feliz da vida por resolver o problema e fui telefonar:
- Mãe, como se cozinha frango?
Enfim, consegui fazer a receita, ficou deliciosa. Saga do frango vencida.
Ah, também me disseram que arroz integral na panela elétrica era super fácil, daí comprei a panela.  Descobri uma característica do arroz que faço: ele é carente e só quer ficar grudadinho. Moral da saga: unidos venceremos!
Nunca mais acredito em ninguém que me diga que cozinhar é fácil. É fácil para quem é com noção!


*Ela foi apresentada aos leitores aqui no texto de 5/7/15.

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